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Política

Ferrogrão: Por que os indígenas são contra?

Ferrovia liga Sinop, em Mato Grosso, ao distrito de Miritituba, no Pará.

Ferrogrão: Por que os indígenas são contra?
Projeto Ferrovia Ferrogrão EF-170 — Foto: Arte G1
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Escoar a produção de grãos e minérios ligando a cidade de Sinop, em Mato Grosso, ao distrito de Miritituba, na cidade de Itaituba, no Pará: esse é o objetivo da ferrovia Ferrogrão (EF-170).

O projeto prevê que os 933 km de trilhos devem passar por dentro da Amazônia e correr próximo a seis terras indígenas e 17 unidades de conservação.

Com a iniciativa ainda no papel, os povos originários se posicionam contrários à construção da ferrovia. Na última quinta-feira (25), durante uma marcha pela Esplanada dos Ministérios, em Brasília, os indígenas protestaram contra a Ferrogrão, entre outras reinvindicações.

 

Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), entidade que representa as tradings e processadoras de soja no Brasil, diz que o projeto é fundamental para os produtores de grãos e o escoamento da safra, mas que espera que a ferrovia seja implementada com respeito aos povos originários (veja nota mais abaixo).

O objetivo da ferrovia é criar uma rota para escoar a produção de grãos do Centro-Oeste do país para os portos do Arco Norte – localizados nas regiões Norte e Nordeste. No entanto, por não terem sido consultadas e pelos impactos socioambientais que a construção pode gerar, as lideranças indígenas apresentam pontos contrários à construção:

 

  • Impactos socioambientais como o desmatamento e perda de biodiversidade
  • Aumento da especulação fundiária, da grilagem de terras, da mineração e da expansão da fronteira agrícola sobre o Cerrado e a Amazônia
  • Tentativa de diminuição do tamanho do Parque Nacional do Jamanxim
  • Favorecimento indevido de empresas transnacionais
  • Planejamento da ferrovia feito sem consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas

 

Segundo o engenheiro civil Sérgio Guimarães, que coordena um grupo de trabalho que estuda os impactos da ferrovia, o projeto, além de gerar desmatamento, depois de pronto tem o potencial de impactar seis terras indígenas e 17 unidades de conservação.

 

 

"O desmatamento da construção em si, não é uma coisa significativa. A construção em si, colocação dos trilhos, tem dificuldades construtivas, têm áreas que ficam submersas e são alagadas durante uma época do ano. Colocados os trilhos, funcionando o projeto, o potencial de desmatamento e de ocupação das áreas de influência do projeto é gigantesco, e há povos indígenas ameaçados que vivem isolados na região", diz o engenheiro.

 

 

Sem consulta prévia

 

A consulta prévia é garantida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) da qual o Brasil é signatário. Ou seja, antes de iniciar qualquer projeto que venha impactar a vida e o território desses povos há o direito de consulta, de acordo com a advogada Bruna Balbi, coordenadora do Programa Amazônia da Terra de Direitos.

 

“Por mais que ainda esteja na fase de planejamento, já deveria ter tido uma consulta prévia aos povos afetados [...] Essas pessoas têm que ser consultadas antes de qualquer tomada de decisão, seja no âmbito do Legislativo ou do Executivo", diz Bruna Balbi.

 

Na marcha rumo ao Palácio do Planalto, durante o Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília, a alegoria de um trem, com os dizeres "trem da morte", "fora garimpo" e "fora mineração", foi uma das maneiras dos povos originários chamarem a atenção para o projeto (veja foto abaixo).

 
Manifestação de indígenas contra Ferrogrão durante o Acampamento Terra Livre em Brasília. — Foto: Fernanda Bastos/g1

Manifestação de indígenas contra Ferrogrão durante o Acampamento Terra Livre em Brasília. — Foto: Fernanda Bastos/g1

A líder indígena Alessandra Korap Munduruku, em entrevista ao g1 na terça-feira (26), durante uma manifestação junto ao Ministério do Meio Ambiente, disse que os povos originários não foram consultados sobre o projeto.

 

"O desmatamento, as mudanças climáticas, a não demarcação dos territórios, a morte e invasão no território, a grilagem. Querem cada vez ir avançando no território", diz a líder indígena.

 

 

Em que pé anda o projeto da Ferrogrão?

 

Supremo Tribunal Federal (STF) determinou, em maio de 2023, que os estudos sobre a Ferrogrão fossem retomados. Corre no tribunal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6553) para julgar a medida provisória que tentou excluir 862 hectares do Parque Nacional do Jamanxim.

 

Depois da decisão do tribunal para a retomada das análises, o novo Programa de Aceleramento do Crescimento (Novo PACdestinou recursos para os estudos para concessões de ferroviasDe acordo com a Casa Civil, os projetos ferroviários foram colocados como prioridade pelo governo e têm investimento previsto de R$ 94,2 bilhões até 2026.

Ministério dos Transportes criou, em outubro de 2023, o Grupo de Trabalho da Ferrogrão que pretende receber ideias, documentos e sugestões para o projeto, além de estabelecer um diálogo com os povos indígenas e produzir um documento técnico.

Até o momento, foram realizadas três reuniões: em novembro e dezembro de 2023, e em fevereiro de 2024. De acordo com o ministério, o grupo de trabalho vai se estender por mais 180 dias para que a população e a sociedade civil possam realizar novas contribuições (veja nota completa abaixo).

Os impactos ambientais, de acordo com o Ministério dos Transportes, são avaliados pelo Ibama que, em nota, disse ao g1 que a viabilidade ambiental do projeto está sendo avaliada e que o processo de licenciamento da ferrovia está na etapa inicial.

A concessão da ferrovia e possíveis violações de direitos dos povos indígenas tramitam no Tribunal de Contas da União (TCU). A Corte diz que "em ambos ainda não há decisão do TCU".

 

Procurada pelo g1, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) não respondeu até a publicação desta reportagem.

 

O que pode ser feito?

 

Segundo o engenherio civil Sérgio Guimarães, é possível encontrar alternativas que possam equilibrar a necessidade do transporte de mercadorias com a redução dos impactos socioambientais.

 

"Tem uma série de órgãos do governo, de controle, que estão atuando em relação aos projetos. Espero que essas políticas de obras de infraestrutura nos programas de governo sejam definidas a partir de critérios de melhor projeto, e não de projeto que é de interesse de um grupo, de um setor", diz o engenheiro.

 

Além do estudo de novas alternativas, a advogada Bruna Balbi afirma que maior transparência sobre o projeto e a consulta prévia, livre e informada dos povos indígenas e comunidades tradicionais afetadas são pontos essenciais para um diálogo com o governo.

 

"Eles gostariam de ser escutados e gostariam, principalmente, de receber mais informações sobre o projeto. As pessoas escutam o nome da Ferrogrão, mas muitas vezes não sabem ao que se refere", diz a advogada.

 

 

O que diz a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais

 

"A Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (ABIOVE), entidade que representa empresas produtoras e comercializadoras de soja, farelo, óleos vegetais e biodiesel, segmento da economia que será um dos principais consumidores da Ferrogrão, entende o projeto como fundamental para a infraestrutura do país no atendimento à produção de grãos e o escoamento de alimentos. Além disso, ressalta a importância do prosseguimento em acordo com as regras vigentes e reafirma sua crença nas instituições brasileiras e no compromisso de todo o setor produtivo em equilibrar desenvolvimento economicamente viável, socialmente responsável e ambientalmente sustentável, com a redução das emissões de gases causadores de efeito estufa na matriz de transportes (importante estratégia para a descarbonização da cadeia produtiva) e com respeito aos direitos dos povos originários sobre as terras tradicionalmente habitadas por eles."

FONTE/CRÉDITOS: g1
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